segunda-feira, 29 de março de 2010

IT Victim III

“Pode falar agora, amor?” Tinha vergonha de usar o celular no carro, mas estava tão excitada pra contar a novidade para o meu marido, que não resisti. “Fiz uma loucura hoje! Está escutando? Mandei um torpedinho para aquele meu amigo de Emeryville. Como qual, meu bem? Aquele do estúdio de animação, na Califórnia. Na hora do almoço fui para o shopping com o notebook e sentei naquele café. Isso! O do wireless! Tomei só um hot chocolate e ele entrou no Skype. Meu foninho da Madonna é tudo nessas horas. Imagine eu, ali no cantinho, combinando em voz baixa como ele me mandaria a versão do desenho na í-n-t-e-g-r-a, com várias cenas inéditas!!! Ninguém tem! Como qual desenho, meu amor? O do escoteiro e do velhinho. Aquele que a casa voa com balões! Não vê que não posso falar tudo? E se meu celular estiver sendo rastreado? Paranóica? Eu? Escuta! Você vai lembrar, é aquele que fomos ver em 3D, mas o Bruninho jogou o óculos no senhor da poltrona da frente. Deu aquela confusão. Lembrou? Então presta atenção! Me senti uma verdadeira traficante internacional. Ele conseguiu pra mim. Pediu sigilo absoluto da fonte com pena de ser demitido. Baixei logo depois, do escritório mesmo. Ninguém percebeu. Santa banda larga! Estou aqui com um pendrive douradinho de muitos gigas. Já disparei um SMS para minhas amigas do escritório. Elas vem em casa com os filhos. Domingo, amor! Cinepipoca. Inclusive minha chefe. A Vaca Profana vai morrer de inveja!!!! Espera! Um marronzinho, te ligo depois.”

Cheguei em casa agitada, larguei tudo no sofá. Pipipipipi. No Nextel uma amiga já confirmava a presença com os dois filhos. Olhei para o home theater. Dei um beijinho na minha telona de LED. Fininha! Linda! O celular tocou: “Dona das divinas tetas, derrama o leite bom na minha cara, e o leite mau na cara dos caretas...” “Alô? Chefinha? Você vem com o Fabinho? Que boooooommm. Domingo, às quatro. Confirmadíssimo!”

Comecei a procurar a entrada USB da televisão. Vasculhei cada cantinho. Olhei de novo. Passei o dedo por toda a lateral. Virei a TV de costas. Olhei na base. Abri a única tampinha que tinha. Nada! “Alô? Você pode falar agora! Eu sei que pode, querido! Cadê a entrada USB da nossa TV? Como não tem? Tem que ter!!! Tem que ter!!! Vem logo pra casaaaaaaaaa!!!!”

A empregada buscou o Bruninho na escola. Ficamos brincando até tarde. Muito tarde e nada do papai chegar. Coloquei o moleque no berço, meio torta. Meu braço doía de tanto tentar fazer o Super Mario voar no Wii. Fui deitar, brava.

Ouvi quando ele chegou e abriu o portão eletrônico. “Está acordada, querida?” “Mais ou menos.” “Vem cá, vem, minha gostosura? Que camisolinha sexy.” “Só depois...” “Só depois de quê? Cheguei cheio de saudades!” “Só depois que você encontrar a entrada USB da televisão!” “O quê?!? Pára com isso, dá um beijinho...” Sentei na cama: “Presta bem atenção: você tem até domingo pra resolver isso!” “Mas, meu bem...” “ Se me quiser é isso mesmo. Eu não vou passar vergonha na frente das minhas amigas. Muito menos da minha chefe!!!!” Deitei, virei para o lado e fingi dormir.

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